Por CPT Nacional

Aviões que pulverizam veneno, incêndios criminosos, 40 anos de espera pela execução de uma sentença favorável à demarcação. Milhares de quilômetros separam as comunidades Melancias (Piauí), Gleba Tauá (Tocantins) e a Travessia do Mirador (Maranhão), mas as violações citadas são frutos de uma mesma raiz: os conflitos fundiários com o agronegócio.

Nos dias 08 e 09 de abril essas comunidades estiveram juntas no Encontro de Troca de Saberes dos Povos do Cerrado, realizado pela Comissão Pastoral da Terra (CPT), na cidade de Barra do Corda, no Maranhão. Na ocasião, além das partilhas sobre histórias e estratégias de luta na defesa dos territórios tradicionais, foram apresentados os estudos Cartografia Social do Mirador (NERA/CPT-MA) e Na fronteira da (i)legalidade: Desmatamento e grilagem no Matopiba (AATR e Campanha Nacional em Defesa do Cerrado).

Como síntese do encontro, as comunidades e as entidades de apoio presentes no evento lançam carta pública denunciando a situação histórica de violação de direitos e agravamento de ameaças às comunidades.

Confira carta na íntegra:

 CARTA DO ENCONTRO DE TROCAS DE SABERES DOS POVOS DO CERRADO DO MARANHÃO, TOCANTINS E PIAUÍ 

“Faz escuro, mas eu canto!”
Thiago de Mello

Nós, Povos e Comunidades Tradicionais do Cerrado no Maranhão, Piauí e Tocantins, reunidos denunciamos publicamente a situação histórica de violação de direitos e agravamento de ameaças aos nossos modos de vida nos territórios aos quais pertencemos.

Estivemos reunidas as seguintes comunidades: Riacho dos Cavalos, Território Melancias – Gilbués-PI, o Território Gleba Tauá, Barra do Ouro-TO e as seguintes comunidades da Travessia do Mirador-MA: Brejo Escuro, Brejo dos Tiros, Vão do Mato, Bacurizeiro, Brejo da Cruz, Brejo Grande, Vazante, Egito, Sítio, Craúna, Centro, Alpercatinha, Angico 1, Angico 2, Brejinho, Canastra, Tiririca, Tustada, Baixão do Coco, Sucuruju e Povo Indígena Apanjekrá-Canela.

Ao compartilharmos nossas histórias de luta e resistência constatamos que temos em comum a longa permanência na terra, demonstrada pela existência dos nossos ancestrais. Somos comunidades que conservamos o Cerrado através dos nossos modos de vida, diversos ambientes, águas, animais, terra e vegetações nativas. Apesar de nossa vida de cuidados com a Mãe Terra sofremos historicamente um mesmo conjunto de violências, somos afetados com a inoperância e opressão do Estado através das polícias e dos órgãos de controle ambiental. Sofremos e repudiamos a grilagem de terra avançar sobre nossos territórios tradicionais e terras públicas com a conivência dos órgãos fundiários e ambientais estaduais (ITERMA, INTERPI, Secretarias Estaduais de Meio Ambiente, Instituto Naturatins) e federais (INCRA, MMA).

Denunciamos o Estado brasileiro pelo apoio subserviente ao agronegócio e à sua lógica de destruição de nossos modos de vida. Lembramos que o momento tirânico e antidemocrático atual, no Brasil, tem favorecido e estimulado a violência no campo. A lógica de tratamento ao MATOPIBA como uma grande área a ser explorada não nos contempla e também o repudiamos.

Denunciamos a utilização ilícita do Cadastro Ambiental Rural – CAR para a “invasão verde” e as “cercas digitais” feitas pelas grandes empresas do agronegócio sobre nossos territórios.

Repudiamos a atuação dos Poderes Executivos Federal, Estaduais e Municipais seja na ação, conivência ou omissão em Políticas Públicas que ameaçam e precarizam nossos territórios.

Exigimos que nossas demandas sejam ouvidas, respeitadas e atendidas.

Fazemos coro junto aos diversos povos indígenas que estão, neste momento em Brasília, no Acampamento Terra Livre, afirmando “Nossos Territórios tradicionais não estão à venda!”

Estiveram entre nós as seguintes entidades de apoio:

Diocese de Balsas (Bispo Dom Valentim Fagundes de Menezes e Padre Nadir Luiz Zanchet, coordenador das Pastorais Sociais da Diocese)

Diocese de Carolina (Bispo Dom Francisco, Referencial da CPT MA)

Rede Eclesiástica Pan-Amazônica-REPAM 

Articulação das CPT’s do Cerrado 

Comissão Pastoral da Terra (MA: TO: PI)

Campanha Nacional em Defesa do Cerrado

Associação dos Advogados e Advogadas de Trabalhadores Rurais – AATR BA

Núcleo de Estudos e Pesquisas em Questão Agrária/NERA UFMA

CÁRITAS Diocesana de Balsas

Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais – STTR Loreto

Congregação das Irmãs Catequistas Franciscanas do CIMI MA (Irmã Graça),

Diocese de Imperatriz – Pastorais Sociais/REPAM (Irmã Virgínia Pitanguy/MAP e Margarida Chaves)

Coletivo de Comunidades do Piauí

Articulação Camponesa de Luta pela Terra e Defesa dos Territórios do Tocantins

 

Barra do Corda-MA/Brasil, 08 e 09 de abril de 2022.

 

Confira mais fotos do encontro:

Imagens: Morgana Damásio-AATR_